segunda-feira, 6 de abril de 2009

Retrato da Bahia em Preto e Preto

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Vila Brandão 69 anos de [R]existência from anapi on Vimeo.


A Vila Brandão, um dos bairros com o menor índice de criminalidade de Salvador - Bahia, vem desde 20 de março de 2009 sofrendo ameaças graves de desapropriação (decreto publicado e aprovado no diário oficial do município) por parte da Prefeitura e especulação imobiliária.

A cobiça por estas terras é bastante antiga, pois o local tem uma das vistas mais bonitas da cidade além de ser muito bem localizado. Porém a Vila tem aproximadamente 69 anos de [R]existência, o que faz dela um bairro e não uma invasão, como adoram dizer os noticiários. Portanto é de extrema falta de respeito que medidas como estas sejam tomadas impunimente, até o dia da publicação do decreto nenhum morador havia sido comunicado por algum representante legal da Prefeitura.

Neste momento, os moradores estão em busca de apoio para conseguir impugnar este decreto desonesto, além disso estão se esforçando para organizar um cadastro da população da Vila, bem como, juntando documentos como comprovantes de pagamento das contas: Água, Luz e IPTU. Para justificar para a prefeitura e sociedade em geral o motivo pelo qual estas terras não podem ser desapropriadas desta maneira.

São muitas as versões e se contradizem entre elas, uma diz que no lugar será construído um parque temático com mirante, numa cidade onde tantos monumentos históricos estão caindo aos pedaços e onde as pessoas têm muitas outras carências de caráter urgente.

Inclusive a Vila é um espaço aberto à sociedade em geral, ela possui uma praça com uma bela vista para a Baía de Todos os Santos, um campinho e uma entrada para o mar onde se pode tomar um delicioso banho. A comunidade local nunca impediu o acesso de ninguém, muitas pessoas que praticam o mergulho descem regularmente por lá.

A infra-estrutura só não é melhor porque a Prefeitura nunca deu um apoio concreto, por exemplo a Limpurb (empresa de coleta de lixo) nunca prestou qualquer serviço de manutenção para a limpeza da Vila. Tudo que lá existe é fruto da dedicação e empreendimento dos próprios moradores.

A Vila Brandão é um exemplo de convívio e respeito às diferenças, nela habitam pescadores, artistas, lavadeiras, estrangeiros, baianas do acarajé, pedreiros, muitas religiões, cores, culturas, além de crianças e idosos.Para aqueles que ainda desconhecem, fica o convite para descobrir este quilombo urbano. E para aqueles que já sabem de toda esta história fica o convite para nos ajudar e apoiar para que a Vila Brandão continue a existir e prosperar.

- Ana Pi e Laura Fresno –


Fonte: http://www.vimeo.com/3826975

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Conheci intimamente a Vila Brandão quando morei na Residência Universitária 2 da UFBA - lá no Largo da Vitória. Eramos duas comunidades carentes - lá - pertinho dos afortunados, poluindo o ar da burguesada do bairro. Pra vocês terem uma idéia, logo ali, ao lado, a mais ou menos 300 metros, no Bairro da Graça, morava o Toninho Malvadeza. Ele frequentava a Igreja do Largo, de um certo Padre Sadoc, negão como eu, mas porta voz "espiritual" - um dos preferidos - da elite rica da Bahia Branca, inclusive do tal coronel citado.

E nós, ali, metidos a bestas na Vitória e na Graça deles. Os "favela" da Vila Brandão efetivamente; e nós, os "tabaréu" do interior, passando uma temporada infindável para eles... Há muito tentam desparopriar os moradores da Brandão... Ainda hoje tentam fechar essas casas universitárias... ou afastá-las desses bairros de ricos.

Na minha estada de três anos e meio na R2, fiz amigos na Vila Brandão... vários: pescadores, sapateiros, domésticas, porteiros... Em comum, os bate-papos no Largo, o baba, uma cerva na banquinha, o pão com salada e ovo na barraca, os banhos de mar...

Sim, nós, os estudantes da Residência Universitária, eramos classificados nos cadastros da Superintendência Estudantil da Universidadae Federal da Bahia na categoria "alunos carentes". Morar na residência e comer de graça no RU (Restaurante Universitário) eram os tais benefícios sociais. Dentro da residência, quando nós, os universitários carentes, trocávamos nossos currículos de vida, não dava outra, a conclusão era sempre o mesmo binômio: Miséria x Superação! Se fossemos originalmente de Salvador, com certeza, viríamos de lugares esquecidos, maltratados, mas resistentes como a Vila Brandão. Ou qualquer outro bolsão de miséria da Bahia Preta que incomoda a elite quando dá para ter orgulho próprio ou se aproximar fisicamente demais de suas narinas assinaladas!

Agora, ainda perplexo, vejo mais esta tentativa de desapropriação das famílias da Vila. Você já pensou, parceiro: depois de sessenta e nove anos, continua chegando representantes de uns especuladores e governantes filhos-da-puta, dizendo "peguem seus pano de bunda e caiam fora"!

Não é fácil...

Por isso, a cada dia, fico ainda mais fã daquele Malcolm X explosivo, dos Panteras Negras e, hoje, mais do que nunca, do revolucionário Fela Anikulapo Kuti! A sorte de meia dúzia, ou azar meu, é que dei de querer sangrá-los com a navalha dos versos e poemas da minha Gramática da Ira.


Nelson Maca - Blackitude.Ba

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Um comentário:

Marcus Gusmão disse...

Se é para criar um espaço público, como argumenta a prefeitura, faço então uma singela sugestão: por que não desapropria o imenso e horroroso galpão do Yacht Clube e faz ali um bela praça, com acesso àquela praia para todos?