Rua Barão Homem de Mello
(Ladeira da Montanha)
Se improvisam sóis na
geometria nublada
das nuvens cinzas
como a colorida vida
que vibra :
no preto-branco de Verger
“ antes prostituta cobiçada hoje Mãe Preta acolhe os proscritos da Montanha”
(J. Correio da Bahia)
na estética fragmentária
da cárie do tempo
roendo cimentos:
nos escombros, ruínas de castelos,
pedaços de muralha
certa comoção na história cristalizada
“a evidente deterioração física não consegue ruir o fascínio que a ladeira provoca em todos. Quem enxerga o local repulsivo mesmo assim esboça uma atração às avessas”
(Pablo Reis, repórter)
na vitalidade d´um mangue
seu ecossistema de restos e dejetos,
d´onde a vida germinando um lótus,
o trama, de dentro de dentro
das estruturas de lama
no céu reflexo que são os gerais abertos
paisagem do nada
chão paralelo do teto, cheio de desertos
A Ladeira da Montanha é prenha desses códigos:
mais do que
arqueologias indecifráveis de belezas
“mais do que as lembranças de gerações que viveram as melhores noites em famosas boates. É mais do que a visão arquitetônica para criar uma imponente ligação entre a cidade alta e a cidade baixa. É mais do que o gosto amargo da decadência e o cheiro sufocante da miséria. Consegue ser maior que o clamor pela revitalização e o reinante mercado do sexo que chega a aceitar R$ 5,00 como preço da submissão corporal”
(jornal Correio da Bahia 02/01/2005)
entre putas, ratos e escombros...
o signo daquilo escapa invicto
ao olho distraído
inversa a lógica de qualquer cronologia
lá reencarna-se dia-a-dia
sem orixás, santos ou magia
.
“....O projeto de revitalização, da Montanha, prevê a reforma dos casarões antigos para a instalação de bares, restaurantes e pousadas no local.”
(por Hélio Rocha, repórter)
assim são, o avesso, da morte nascendo
a cada diária, sina da batalha que se trava
entre a vida e o nada
são o verso, antônimo da vida
com suas casas cariadas, a risada das putas,
as encruzilhadas, suas chagas, noites e noitadas
.
“ nem o caminhar aos 150 anos, nem arquitetura antiga, nem a história do lugar , nada é suficiente ao tombamento da montanha?, querem é vender a montanha aos empresários, em vez de construir lá museus e teatros... transformá-la em herança cultural...”
(...depoimentos de soteropolitanos)
a Montanha, erguida em sua arquitetura de pobreza,
por engrenagens e maquinismos da vida
e suas tristes tecidas teias
acha dendo escuro luto uma luz qualquer que vaza:
vela, córnea, poste, lanterna...
que acesa dentro da treva
faz as vezes de um sol, às avessas
porque raia intestina
quando a vida ávida de si, instintiva se manifesta – ecoando gargalhadas da própria desgraça
- Augusto da Maia
Largo dos Aflitos
Largo dos aflitos, miro. a cidade até
Largo dos aflitos, miro. a cidade até
Itaparica cabe dentro nos
meus olhos a tarde cai desbotando
azuis das cores do dia
o céu se despede e se despedaça
o céu se despede e se despedaça
em gestos de adeus
em adeus
em adeus
a vida que não pára de partir...
na tarde igual as outras
acena seus gestos de nuvem
Augusto da Maia
Augusto da Maia
EM BREVE -
TEXTO : "A Cena Literária - Tópicos de uma nova poesia baiana"
de Augusto da Maia (Já em edição!)
Um comentário:
Gostaria, apenas, de dizer que este poema desta Ladeira da Montanha do poeta Augusto da Maia, é simplesmente lindo!
Jorge, mesmo, sabendo que ele vinha sendo gestado há tempos, obrigado por trazê-los à luz aqui na nossa Gramática!
Seu leitor,
Nelson Maca
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