quinta-feira, 26 de março de 2009

Fiel!!

.
Fidelidade!
.

"Eu não consegui dizer nada. Travou-me a mente com tamanho sentimento de culpa, vergonha ou sei lá o quê que eu sentia. Lembro bem quando ele guardou a faca na cintura de novo e, diante de meu silêncio desconcertado, se despediu.

Lembro também que, nas quantas e tantas vezes que ele me encontra, sempre nos desvios da Bahia Preta, abre os braços em sorriso largo e me abraça com força. Apesar de, sempre, antes da recíproca, eu ter que abstrair seu cheiro e seu aspecto, para, depois, mergulhar em seu ombro minha narina sobrevivente que, às vezes, meio que se esquece daqueles tempos de senzala... mas, depois, mergulho, renascido, sem mais superfície de nojo, no cheiro forte do poço pegajoso e fundo de nosso respeito em amor de rua.

- Cara, vô nessa. Vamo, Princesa!

Falou amorosa, mas rispidamente, com sua cadela vadia que não perdera uma sílaba de nossa conversa, sem interferir, nem mesmo em grunhido, uma só vez no desabafo do companheiro. Ela o acompanhou, pulando em suas pernas, latindo como que querendo distraí-lo, concluí comigo depois do mal feito.

- Que caraio, hein, Pinduka? Se ligou na fita?
- Louco, né? Falar o quê?
- Ela o compreende melhor que eu.
- Como?
- Deixa quieto, irmão. Preciso ir agora.

Foi o máximo que pude elaborar, puxando o fio de humanidade restante em mim naquele momento. Macacos Velhos que achamos que somos, ainda caímos nas armadilhas e nos descaminhos que a Bahia Preta sempre arma pra nós, colocando-nos em contramão que provoca choques intra-destrutivos."

Trecho do conto: Fidelidade!
Livro: RGP (orgulhosamente engavetado)
Autor: Nelson Maca (Eu mesmo!)

.

Nenhum comentário: