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Calma, rapaz!
Então eu resolvi afundar os negreiros
Afogar capitães e marinheiros do empreendimento
No mesmo sal do mar que me sugava os restos corroídos
Foi quando esta voz sussurrou ao meu ouvido:
Calma, Rapaz!
Então eu resolvi incendiar a casa grande
Queimar as sinhás e sinhôs
Com o mesmo fogo do ferro que me fritava a carne
Foi quando esta voz sussurrou ao meu ouvido:
Calma, Rapaz!
Então eu resolvi contaminar os alimentos
Para liquidar os donos do algodão e do fumo
Com o mesmo veneno que me inflamava o banzo
Foi quando esta voz sussurrou ao meu ouvido:
Calma, Rapaz!
Então eu resolvi alvejar a cabeça do capitão do mato
Para dominar o campo de batalha em que eu vivia
Com o mesmo trabuco que me atingia as costas
quando eu fugia
Foi quando esta voz sussurrou ao meu ouvido:
Calma, Rapaz!
Então eu resolvi cortar a garganta da princesa de maio
Para exterminar de vez as falácias da abolição
Com a mesma navalha que me decepava os dedos
de negro fujão
Foi quando esta voz sussurrou ao meu ouvido:
Calma, Rapaz!
Então, eu resolvi seqüestrar o dono da fábrica
Para reparar as deficiências do meu salário que é o mínimo
Com a mesma neutralidade que me seqüestraram
a força ativa
Foi quando esta voz sussurrou ao meu ouvido:
Calma, Rapaz!
Então eu resolvi socar a boca do primeiro filho da puta
que aparecesse
Para sangrar a oligarquia dos que sempre nos calam
Com o mesmo punho cerrado que sempre nos socaram
Mas esta voz ainda sussurrou ao meu ouvido:
Calma, Rapaz! Calma, Rapaz!
(do livro Gramática da Ira / poemas locais engavetados)
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sexta-feira, 1 de maio de 2009
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3 comentários:
Mto foda o teu poema! Saúde e força!
Winnie Mandela uma vez escreveu:
"O branco chegou com a Bíblia em uma das mãos e a arma na outra; deu ao negro a Bíblia e tomou-lhe a terra.
E ainda ensinou ao negro: 'Se eu, o teu senhor, te bater numa das faces, então apresenta a outra; pois a tua paz, vais vivê-la na outra vida, no além'.
Só que um dia descobrimos que a nossa terra é esse 'outro mundo', essa 'outra vida'.
O branco alegra-se neste céu aqui no presente. A nós, porém, ele quer persuadir de que a nossa parte neste céu, nesta terra, estaria no além.
Não queremos participação espiritual na nossa terra. Queremos aqui e agora esta terra, que construímos."
Perfeito, guerreiramente perfeito!
Não tenha calma rapaz, cuspa!
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